Memória
Matava-me.
Matava-me aquela vontade de ver o que ainda não podia. Retrucava, de mansinho:
– Deixa, por favor! E depois de tanta insistência, ela permitiu que eu parasse
em frente à TV antiga e lá ficasse. – Mas só se eu também assistir, sentenciou
– com aquele tom de ameaça que a infância fareja de longe. Concordei, encurralada
que estava. A película era inspirada n’O
homem nu, do Fernando Sabino. – Impróprio, ela dizia.
Passado o
primeiro momento, meio vexatório para nós duas, assistimos ao filme inteiro. Sorríamos.
*
Mal imaginava
que aquele momento ficaria cravado em minhas lembranças. Naquela madrugada,
vivi o acontecimento mais genuíno de toda a nossa história: ela, uma velhinha, eu,
uma pequena, que já começava a descobrir a vida, esquecemos todas as
mágoas. E, numa cumplicidade embaraçosa, soube o que era ter à mãe da minha mãe
por perto.
Ela, cheia de
direções no azul dos olhos, nunca mais ficou ao meu lado.
Delicado e lindo!
ResponderExcluir